Internacional 5 Feb, 2016
Há quatro anos destacavam-se entre os que exigiam castigos mais duros para Portugal.
Agora estão em crise profunda e não querem a mesma austeridade que nos foi imposta.
Quando olham para o sucesso sueco, norueguês e dinamarquês, os finlandeses retiram uma conclusão óbvia: para evitar um massacre social e económico como o nosso, têm de sair do Euro.
Não deixa de ser irónico: o país que disse que Portugal endividado tinha de ser expulso da Zona Euro atravessa agora uma crise de tal amplitude que talvez tenha, ele próprio, de deixar de usar a moeda única.
Recentemente, Paavo Väyrynen, eurodeputado pelo Partido do Centro da Finlândia (actualmente no poder), afirmou mesmo que o seu país “não tem tempo para desperdiçar na saída do Euro”.
O político reuniu os 50 mil apoios escritos necessários para a convocação de um referendo sobre o tema, mas adianta que vai tentar que a decisão seja directamente tomada pelo parlamento, tal a pressa: “um referendo demoraria anos” a concretizar, referiu.
O Governo, de centro-direita, está dividido sobre que caminho escolher.
Após quatro anos de recessão, a economia deste país nórdico encontra-se completamente estagnada.
A Comissão Europeia admitiu, na semana passada, que a Finlândia é hoje o Estado-membro com menor crescimento: meio por cento.
Enquanto o país agredia verbalmente Portugal, não deu atenção suficiente aos seus próprios problemas.
Os custos de mão-de-obra do país são 10 a 15 por cento mais elevadas do que os dos seus parceiros comerciais, disparidade que já não pode ser consertada com uma desvalorização monetária, apenas com austeridade.
Curiosamente, quando o mesmo aconteceu em Portugal, os finlandeses foram dos primeiros a defender que os portugueses tinham de se tornar mais competitivos, e que não tínhamos sequer dignidade suficiente para o actual ordenado mínimo.
A palavra “flexibilização laboral” também entrou no léxico da antiga colónia russa, saída da boca de Olli Rehn, o antigo comissário da UE odiado pelos europeus do sul.
Dois feriados vão ser cortados, e as empresas vão deixar de ser obrigadas a negociar em concertação social, passando a poder pagar o mínimo possível.
Previsivelmente, os finlandeses saíram à rua para paralisar o país com greves.
Depois de quererem condenar Portugal a vários anos de dor, os finlandeses não querem o mesmo remédio.
Mas há quem acha que nenhum dos países tinha de passar pelo desastre que agora enfrenta.
Soberania monetária
Sem o peso do dogmatismo pro-europeísta, dois académicos finlandeses elaboraram um estudo que permitiu projectar o que teria acontecido se o país nunca tivesse abandonado a sua antiga moeda, o “Markka”.
Segundo a simulação, com o impacto da crise, o Markka teria desvalorizado 20 por cento em relação ao Euro, mas a recuperação económica do país teria sido muito mais veloz, pois as exportações teriam aumentado 15 por cento.
Um dos académicos, Tuomas Malinen, é decisivo nas suas conclusões: a culpa da estagnação do país é do Euro.
Admitindo que o colapso da Nokia e o mercado de trabalho rígido são problemas estruturais graves, as conclusões do académico são que “apenas se tornaram um problema inultrapassável porque a Finlândia usa o Euro”.
No entanto, fica a nota: abandonar a moeda única tem custos, que os académicos estimam em 20 mil milhões de euros.
Para os detractores do Euro, o custo valeria a pena, e seria recuperado após alguns anos. Caso exemplar é a Suécia, um pequeno oásis de prosperidade no meio de um deserto económico: durante o período da crise na Europa, o país cresceu oito por cento.
Em comparação, a Zona Euro ainda não regressou aos níveis económicos pré-recessão.
Outro exemplo é o Reino Unido, que é hoje a economia mais pujante da Europa, tudo porque gere a Libra Esterlina conforme as suas necessidades.
Do outro lado do canal, a França enfrenta mais um ano de elevado desemprego e crescimento quase nulo.
Não admira, pois, que David Cameron já tenha explicado taxativamente a Bruxelas que nunca, por nunca ser, a União Europeia poderá exigir que o seu país adopte o Euro.
A dura realidade da moeda única
Todas as principais agências de ‘rating’ colocaram as perspectivas da Finlândia em “negativo”, e o Governo vai ter de aumentar a dívida em 13 mil milhões de euros em 2016, na melhor das hipóteses.
A despesa pública do país representa agora 58 por cento do PIB nacional, o valor mais elevado da Europa e um dos mais elevados do mundo.
A União Europeia governou a sua moeda apenas em benefício de um único país durante demasiado tempo, e não faz os necessários incentivos monetários a tempo.
Apesar de Mário Draghi ter o Banco Central Europeu a oferecer amplos estímulos financeiros, incluindo uma taxa de juro (e, por arrasto, de crédito) perto de zero por cento, a economia Europeia continua estagnada e a deflação começou a instalar-se.
Na Finlândia, os políticos pró-europeus falam, de forma desesperada, em “inovação” para consertar os problemas da Nação.
De facto, o país é casa de alguns dos melhores técnicos, cientistas e profissionais do mundo, mas criar nova riqueza é difícil.
No seu auge, a Nokia dava emprego a quase 200 mil pessoas.
Hoje, o sector dos videojogos, que o Governo local aplaude como um exemplo, apenas emprega 2.600 trabalhadores.
Apesar de haver ideias, e até financiamento, exportar com o peso do Euro é muito difícil.
O desinvestimento no sector da educação e a “fuga de cérebros” para países mais prósperos e dinâmicos, como o Reino Unido e os Estados Unidos, coloca ainda o futuro do pequeno país mais em causa, tal como acontece actualmente em Portugal.
Vale a pena continuar no Euro?
É possível que os finlandeses em breve votem sobre o assunto.
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