JOÃO RUELA RIBEIRO
18 de Outubro de 2017, 18:11
Xi Jinping durante a abertura do Congresso do Partido Comunista Chinês, com os ex-secretários-gerais, Hu Jintao (esquerda) e Jiang Zemin (direita)
O Congresso do Partido Comunista abriu com três horas de promessas de grandeza e com avisos contra o “auto-isolamento” das grandes nações, sem mencionar Trump. Presidente sugeriu que o modelo chinês pode ser alternativa para outros países.
O Presidente chinês, Xi Jinping, utilizou o discurso de abertura do 19.º Congresso do Partido Comunista para guiar os mais de dois mil delegados – e também o mundo – por aquilo que serão as próximas décadas, durante as quais se inaugura uma “nova era” no desenvolvimento do país. O grande objectivo é fazer da China uma “potência global”.
Foi um discurso extraordinariamente longo (mais de três horas), num tom calmo e monocórdico, contrastando com a confiança e a ambição do seu conteúdo. Xi anunciou a construção de uma “nação socialista moderna” que entra agora numa “nova era” de desenvolvimento. As teses de Xi, que vão ser elevadas a doutrina oficial do PCC no final do Congresso, na próxima quarta-feira, não são uma ruptura com o passado, mas sim mais uma fase na história da República Popular.
“Depois de décadas de trabalho duro, o socialismo com características chinesas entrou no limiar de uma nova era”, declarou o também secretário-geral do partido. Xi não escondeu o carácter transformador que o seu discurso pretende imprimir junto das esferas do poder na China, tendo utilizado a expressão “nova era” 36 vezes durante a sua declaração, diz a Reuters.
O líder chinês prometeu que em 2049, quando se assinalar o centenário da fundação da República Popular, o país “irá posicionar-se de forma orgulhosa entre as nações do mundo” e tornar-se “numa potência global”. “Esta será uma era em que a China irá aproximar-se do palco principal e irá fazer maiores contribuições para a humanidade”, prometeu Xi.
E esse regresso parece estar para breve. A agência Nova China notava que a China “entrou na era com a maior força nacional conjunta desde as Guerras do Ópio que atiraram a China para as trevas da instabilidade doméstica e da agressão estrangeira”.
A analista Elizabeth Economy disse ao The Guardian que Xi “acredita que para que a China recupere a sua grandiosidade histórica, a sua centralidade no mundo, é necessário um líder forte, e ele é a pessoa ideal para isso”.
Sistema alternativo?
O renovado optimismo deve-se às décadas “de luta incansável” liderada pelo Partido Comunista Chinês e que possibilitaram a elevação de milhões de pessoas da pobreza. E, por isso, a manutenção do sistema é prioritária, com Xi a recusar “copiar mecanicamente os sistemas políticos de outros países”. “Devemos apoiar inabalavelmente e melhorar a liderança partidária para fortalecer o partido”, disse Xi aos delegados.
O secretário-geral foi mais além e disse que o sucesso do modelo chinês mostra que “há uma nova escolha para os outros países”. A linha tradicional da política externa chinesa sempre foi caracterizada pela oposição a “exportações ideológicas”, ao contrário, por exemplo, do que acontecia na União Soviética, mas as palavras de Xi sugerem que Pequim poderá, no futuro, procurar pelo menos inspirar outros países a adoptarem práticas mais próximas das suas.
Uma das principais mensagens veiculadas pelos media estatais nas vésperas do Congresso passou precisamente pela exaltação das vantagens do sistema chinês por oposição à “política ocidental conflituosa e competitiva”.
Apesar de longo, o discurso de Xi não deu indicações de políticas concretas que possam vir a ser seguidas durante o seu segundo mandato. Mas a promessa de ascensão da China a um novo patamar na arena global tem uma continuidade com algumas tendências que se verificaram nos últimos anos e que apontam para uma maior intervenção.
É expectável que a China continue a procurar consolidar a sua posição na Ásia, onde o Mar do Sul tem assumido uma posição central. As reivindicações territoriais de Pequim sobre a quase totalidade do mar meridional colidem com as ambições de vários países vizinhos – apoiados pelos EUA, que pretendem manter a sua influência sobre o Pacífico. Pequim é acusada de estar a "militarizar" a região, através da construção de ilhas artificiais e de patrulhas pela sua Marinha, mas Xi voltou a sublinhar que a China “não representa uma ameaça para nenhum país”. O Presidente dedicou, no entanto, uma frase do discurso a sublinhar o “progresso sustentado” da construção no Mar do Sul.
Outra das pedras basilares da política externa chinesa é a chamada “nova rota da seda”, um conjunto de projectos de construção de infraestruturas em mais de 60 países da Ásia Central, Médio Oriente e África para ligar as grandes metrópoles chinesas à Europa. Xi não falou concretamente da iniciativa, mas defendeu os méritos do comércio livre: “Uma economia aberta irá trazer melhorias, enquanto uma fechada apenas irá ficar para trás.”
A China tem igualmente adoptado um papel cada vez mais determinante nas instituições internacionais, sendo já um dos países que mais contribui com capacetes azuis para missões da ONU. No ano passado, Pequim anunciou também que pretende entregar à ONU mil milhões de dólares ao longo da próxima década.
O clima é outro dos pontos fulcrais para a liderança chinesa e Xi prometeu defender a aplicação das metas de emissões de carbono fixadas pelo acordo de Paris – do qual os EUA saíram por ordem Donald Trump. Sem mencionar o nome do Presidente norte-americano, Xi afirmou que “nenhum país pode dar-se ao luxo de recuar para o auto-isolamento”.
joao.ruela@publico.pt
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