As armas calaram-se na província de Latakia, bastião do regime de Bashar al-Assad, e nos subúrbios a leste de Damasco, cumprindo o “regime de calma” negociado entre a Rússia e os Estados Unidos.
Mas já não há trégua nem tentativas para a salvar em Alepo, a grande cidade do Norte da Síria, onde pelo nono dia consecutivo, os aviões voltaram a bombardear os bairros controlados pelos rebeldes.
“Até agora não houve actividade militar, nem sons de bombardeamentos nas áreas vizinhas”, disse à Reuters um habitante de Ghuta, o principal reduto da rebelião na região de Damasco e que foi, como os outros grandes campos de batalha, palco de intensos confrontos na última semana.
O director do Observatório Sírio dos Direitos Humanos, grupo que conta com uma rede de activistas no terreno, confirmou também a acalmia no norte da província de Latakia desde a madrugada de sábado.
É pouco claro o que acontecerá quando a trégua imposta aos beligerantes pelas duas potências internacionais terminar – em Ghuta foi apenas negociado um dia de tréguas, em Latakia três.
Mas a iniciativa foi apresentada como uma tentativa para salvar a “cessação de hostilidades” decretada em Fevereiro e que, apesar de várias vezes violada, permitiu o regresso à mesa das negociações de representantes do Governo e da oposição.
Uma iniciativa in-extremis perante as notícias de que Damasco se prepara para avançar sobre a metade Leste de Alepo, controlada desde 2012 pelos rebeldes e cercada desde o início do ano.
A delegação da oposição síria abandou na quarta-feira as negociações em Genebra e a hipótese de um regresso tornou-se ainda mais ténue perante o anúncio, feito neste sábado, de que a Rússia não vai pressionar Assad a suspender os bombardeamentos contra Alepo.
“É preciso compreender que se trata aqui de uma luta contra a ameaça terrorista”, afirmou o vice-ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Guennadi Gatilov, citado pela agência Interfax.
Moscovo classifica como terroristas vários dos grupos islamistas que combatem o Exército sírio nas províncias do Norte e já exigiu o seu afastamento das negociações.
Civis em fuga
Fazendo eco das palavras de Gatilov, novos bombardeamentos atingiram durante a manhã deste sábado várias áreas da cidade – o Observatório contabilizou pelo menos 30 ataques, que terão feito pelo menos cinco mortos.
Horas antes, ainda o sol não tinha nascido, um jornalista da AFP testemunhou a fuga de dezenas de pessoas do bairro de Bustan al-Qasr, um dos mais massacrados pelos bombardeamentos dos últimos dias.
“A situação tornou-se insuportável”, explicou Abu Mohammad, que partia com a mulher e cinco filhos em busca de uma zona mais segura, deixando para trás a casa e a sua loja de electrodomésticos.
Nas áreas controladas pelo Governo, na zona ocidental da cidade, a situação esteve “um pouco mais calma” do que nos últimos dias, mas a espaços havia disparos da rebelião, afirmou o director da ONG, Rami Abdulrahman.
Na última semana, pelo menos 250 pessoas terão morrido em Alepo – 140 nas zonas controladas pelos rebeldes, 96 nos bairros nas mãos do Exército –, incluindo 27 funcionários e pacientes do hospital al-Quds, uma instituição apoiada pelos Médicos Sem Fronteiras onde trabalhava um dos últimos pediatras da cidade.
A Turquia e a Arábia Saudita, apoiantes dos rebeldes, acusam Assad de estar a bloquear “voluntariamente” as negociações e de, com a cobertura dos seus aliados, estar a cometer “crimes de guerra”.
E se o horror já pouco incomoda, há números que ainda chocam.
Um estudo divulgado nesta semana, conduzido pela Comissão Económica e Social da ONU para a Ásia Ocidental e a Universidade de St Andrews na Escócia, revela que 83,4% dos habitantes vivem em situação de pobreza (antes da guerra eram 28%).
No país há 13,5 milhões de pessoas necessitadas de ajuda humanitária, quatro milhões só em Damasco e Alepo, e dos quase 500 hospitais que o país tinha a funcionar antes do início da guerra, mais de um terço (170) foram totalmente destruídos.
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