KARAM AL-MASRI (em Aleppo) 12/02/2016 - 16:39
A única estrada que ainda abastecia a cidade, a partir da Turquia, foi cortada. Os preços sobem vertiginosamente e a electricidade foi ainda mais racionada. Quase 300 mil pessoas estão isoladas.
"O que acontecerá quando não houver mais nada para comer? Morremos de fome?".
Como tantos habitantes de Alepo, Abu Mohammad teme que o pior aconteça à sua cidade, cercada pelas forças do regime de Damasco.
"Aqui, toda a gente tem medo do cerco.
É inevitável sentirmos a sua proximidade", testemunha este vendedor ambulante de 42 anos do bairro de Firdaus (Paraíso, em árabe), no sudeste da grande cidade do Norte da Síria.
Desde que o exército, apoiado pelos russos, conseguiu, no início do mês, cortar a principal rota de abastecimento que a ligava a cidade à Turquia, este sentimento é generalizado em toda a zona de Alepo controlada pelos rebeldes.
O impacto desse corte fez-se sentir rapidamente: as lojas ficaram sem mercadorias, os preços dos produtos subiram vertiginosamente e o medo da penúria instalou-se entre os quase 300 mil habitantes que ficaram isolados.
"Tenho uma reserva de farinha, de arroz, de açúcar e de óleo que é suficiente para alimentar a minha família durante três meses, mais ou menos", diz, inquieto, Abu Omar, pai de três crianças que vive no bairro de Kallassé.
"As matérias primas começam a escassear, várias lojas fecharam e os preços duplicaram", acrescenta.
"O preço do litro do óleo combustível passou de 180 libras sírias [45 cêntimos] para 300 libras [75 cêntimos].
Só o usamos para nos aquecermos pois faz muito frio por estes dias".
No desemprego desde há um ano, este habitante de Alepo não pode pensar em refugiar-se na Turquia, como fizeram milhares de pessoas da cidade.
Os traficantes cobram 200 dólares por pessoa pela passagem da fronteira, diz.
Para sair da zona controlada pelos rebeldes, só há uma estrada, chamada do Castello, que liga o Norte da segunda cidade mais importante síria e a fronteira com a Turquia.
Mas este caminho é bem mais longo e perigoso do que a estrada que era usada para o abastecimento da cidade cortada a 3 de Fevereiro.
Cinco anos depois do início da guerra, Alepo não tem qualquer semelhança com a cidade que era conhecida pelo seu dinamismo económico e pela sua gastronomia.
Os seus célebres souks foram destruídos pelos combates e a cidade está dividida em dois desde 2012.
Os habitantes podem passar de um sector para o outro através de postos de controlo do exército apenas em casos excepcionais.
No bairro de Shaar, desfigurado pelos barris de explosivos lançados diariamente pelo regime, o comerciante Abu Ali, de 50 anos, garante "já não ter" provisões.
"Vinha tudo da Turquia, agora isso acabou.
E as pessoas pararam de comprar", diz, desolado.
"O que ganhei em duas semanas só dá para pagar o gerador da loja".
Mas Abu Mohammad, que tem que alimentar sete filhos, critica os comerciantes que "lucram com esta situação, aproveitando para fazer dinheiro".
"Alguns deles escondem a mercadoria para venderem alguns dias depois, pelo dobro do preço", conta.
Lamenta que um quilo de bananas custe "entre 150 e 300 libras" sírias e que um pacote de pão esteja por "100 ou 250".
Mohammad Jokhadar, um activista de 27 anos de Zabadiya, diz que já não recebem o óleo combustível que fazia trabalhar geradores, padarias e veículos.
A corrente eléctrica "passou de 14 horas para seis" por dia.
Questionado sobre uma possível rendição da parte leste de Alepo, Abu Qorniya, um rebelde que participou nos combates no norte da cidade, afirma: "Isso seria uma catástrofe".
O Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad al-Hussein, disse quarta-feira que estava "extremamente alarmado" com a rápida deterioração da situação em Alepo.
Antes da ofensiva de Fevereiro, a ONU avaliou em meio milhão o número de pessoas que vivem em cidades sitiadas em toda a Síria.
Mas as organizações não governamentais PAX (holandesa) e The Syria Institute (americana) dizem que são mais de um milhão.
A guerra deslocou 51 mil de pessoas da província de Alepo desde 1 de Fevereiro, indica a ONU - estão espalhadas pelos dez campos que surgiram junto à fronteira turca (que o governo de Ancara fechou) que já albergam cem mil pessoas.
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