Ajuda Externa Dinheiro Vivo/Lusa 29.06.2016 / 17:23
quarta-feira, 29 de junho de 2016
Centeno responde a Schäuble: Não haverá novo resgate
Resgate Dinheiro Vivo 29.06.2016 / 17:13
Schäuble prepara plano para “nova UE”, incluindo poder de veto sobre orçamentos
União Europeia - Filipe Paiva Cardoso 28.06.2016 / 19:08
Schäuble corrige: Portugal não precisa de resgate se cumprir regras
sábado, 25 de junho de 2016
O que Brexit significa para o mundo
Análise
25 de junho de 2016 | 13:19 GMT
25 de junho de 2016 | 13:19 GMT
David Cameron não resistiu à derrota no referendo britânico à UE. Boris Johnson, o senhor que se pode seguir, diz que “nada vai mudar no curto prazo”, mas líderes europeus discordam
O sismo, sentido através da Europa, aconteceu pouco antes das 5:00.
A contagem de votos do referendo não deixava margem para dúvidas: 43 anos depois da adesão, a maioria dos eleitores britânicos decidiu que o Reino Unido deve sair da União Europeia, naquele que é o maior golpe infligido ao projecto europeu nascido das cinzas da II Guerra Mundial.
O divórcio demorará anos a ser consumado, mas o referendo começou já a mudar a realidade política no país e na Europa e no horizonte pairam agora, com maior intensidade, ameaças de desagregação.
A intensidade do abalo mediu-se nas declarações de “choque”, “desilusão” e “tristeza” que rapidamente se ouviram em todas as capitais europeias, fazendo antever que os líderes europeus podem não estar (ainda) em sintonia, mas sentem que têm de dar ao Reino Unido uma resposta que desincentive outros países a seguir-lhe o caminho.
Mas foi nas praças europeias que os sismógrafos registaram maior oscilação – quando as televisões deram o resultado como certo, a libra tinha já atingido o seu valor mais baixo face ao dólar desde 1985, sofrendo a maior queda de que há registo.
A cotação dos principais bancos caiu também a pique, num dia de transacções que começou com pânico e terminou com grandes perdas.
E não foi preciso esperar muito para confirmar uma das poucas certezas do dia – a de que Cameron não sobreviveria à pesada derrota que sofreu naquela que disse ser a luta da sua vida.
Ao início da manhã, numa declaração à porta de Downing Street, o líder conservador anunciou a sua demissão – que não é imediata, mas que ele próprio espera ver concretizada antes da próxima convenção do partido, em Outubro.
“O povo britânico decidiu de forma muito clara que quer seguir um caminho diferente e para isso o país precisa de uma nova liderança”, afirmou, com a voz incapaz de esconder a emoção”.
“Farei tudo o que puder enquanto primeiro-ministro para manter este navio estável nas próximas semanas e nos próximos meses, mas não creio que seria correcto tentar ser o comandante que conduz o nosso país até ao próximo destino.”
Sem pressa
O que Bruxelas e todas as capitais europeias queriam saber era se Cameron iria cumprir a promessa de accionar o quanto antes o artigo 50 do Tratado de Lisboa.
Só depois de Londres invocar esta cláusula até agora intocada serão desencadeadas as negociações formais para desatar os nós apertados que ligam o Reino Unido a Bruxelas e que, em teoria, devem estar concluídas no prazo de dois anos.
À UE interessa o mínimo de incerteza.
Mas o líder conservador é, antes de mais, um pragmático e reconheceu que, desautorizado pelo voto de 17 milhões de britânicos (52% dos votos expressos) não podia ser ele a decidir sequer os moldes em que o difícil processo vai arrancar.
“Deve ser o próximo primeiro-ministro a tomar essa decisão”, explicou.
O adiamento não agradou à maioria dos líderes europeus, mas em Londres a decisão é vista como inevitável – por um lado, dá à economia algum tempo para absorver o choque inicial da decisão; por outro, é agora evidente que os que fizeram campanha pelo “Brexit” não têm ainda um plano para concretizar a saída.
Na primeira comunicação oficial ao país, o antigo mayor de Londres, tido como o grande favorito à sucessão de Cameron, garantiu que “não há necessidade de apressar” os preparativos para a saída.
Em tom solene, quase sombrio, Johnson tentou ao máximo tranquilizar aqueles que na manhã desta sexta-feira acordaram em choque para a nova realidade, assegurando que “nada vai mudar no curto prazo”.
Aos investidores disse que o Reino Unido “vai continuar a ser uma grande potência europeia”, que terá na política externa “uma voz equivalente à da quinta maior economia do mundo”.
Aos jovens, assegurou que a saída da UE não lhes fechará as portas da Europa, e aos milhões de cidadãos comunitários que vivem no país fez saber que o Reino Unido “não vai virar as costas” ao continente ao qual pertence.
Fracturas e tensão
Mas a vitória do “Brexit” não foi só de Boris.
Foi também (ou sobretudo) de Nigel Farage, o líder do partido antieuropeu UKIP, que empunhou sem remorso a bandeira da imigração para mobilizar os eleitores descontentes, os excluídos pela globalização e maltratados pelas convulsões da economia.
“A UE está a falhar, a UE está a morrer”, declarou em tom triunfante, manhã cedo, frente ao Palácio de Westminster no qual tenta há anos entrar e onde o UKIP continua a ter apenas um deputado.
Selada a saída pela qual luta há mais de 20 anos, o líder populista não poupou na retórica – “Derrubámos o primeiro tijolo do muro, espero que este seja um primeiro passo para uma Europa de nações soberanas”.
E, de dedo apontado ao Parlamento, avisou que o passo lento preferido por Boris e os seus aliados não é suficiente para o UKIP: “As pessoas aqui não percebem.
São demasiado ricas, não percebem o que a imigração maciça que resulta da UE fez aos salários das pessoas, à capacidade delas para terem acesso a um médico ou porem os filhos nas escolas”.
No Partido Conservador, a saída de cena de Cameron – 11 anos depois de ter chegado à liderança dos tories com o desafio de enterrar a “velha obsessão europeia” – escancara a porta de Downing Street aos eurocépticos, a facção que depois de décadas em minoria sai coroada deste referendo.
Johnson parte na frente, mas na corrida poderá também estar a actual ministra da Administração Interna, Theresa May, que apesar de se ter mantido ao lado de Cameron no referendo, observou durante toda a campanha um silêncio quase religioso.
Fica por perceber o que fará a facção pró-europeia do partido, ainda maioritária no Governo, e como conseguirá o novo líder unir um partido que travou a campanha em clima de guerra civil.
Não são, no entanto, só os tories que têm de reparar pontes destruídas.
O referendo provou o que as últimas legislativas já tinham mostrado – o UKIP está a canibalizar o descontentamento dos eleitores nas regiões do Norte que foram durante décadas zonas seguras dos trabalhistas.
Nestas regiões, dizem os analistas, o que mais pesa é o sentimento anti-imigração e a descrença na classe política.
Mas para a oposição interna, que há muito duvida da capacidade de Jeremy Corbyn para ganhar eleições, o líder do partido chegou demasiado tarde à campanha e foi incapaz de defender a importância da UE junto de um eleitorado que teria sido decisivo para evitar o “Brexit”.
“Um líder tem de ser alguém que seja capaz de comunicar uma mensagem e inspirar confiança nessa mensagem.
E Jeremy Corbyn falhou nas duas frentes”, disse à Sky News a deputada Ann Coffey, co-autora da primeira moção de desconfiança que o líder trabalhista enfrenta desde que foi eleito, há menos de um ano.
O documento deverá ser discutido numa reunião do grupo parlamentar no início da próxima semana e, se vier a ser aprovado pelos deputados, desencadeará uma eleição interna. Corbyn, que nunca teve do seu lado a maioria da bancada parlamentar poderá sempre contar com o apoio do grosso dos militantes e dos sindicatos para ser reeleito.
Mas a instabilidade política desencadeada por este referendo não se resume a Londres, tanto mais que a votação mostrou fortes assimetrias regionais, com a capital, a Escócia e a Irlanda do Norte a votarem em sentido contrário ao da restante Inglaterra e País de Gales.
Ainda as palavras com que Boris Johnson quis tranquilizar os britânicos estavam frescas, quando a líder do governo autónomo escocês veio afirmar que o actual arranjo constitucional pode ser insustentável.
A Escócia considera “democraticamente inaceitável” ser arrastada para fora da UE pelo voto inglês, afirmou Nicola Sturgeon, afirmando que “um [novo] referendo à independência é agora altamente provável”.
Já antes, o Sinn Féin, o maior partido republicano da Irlanda do Norte, avisara que a saída da UE “intensifica o argumento a favor da unificação da Irlanda” – uma alusão que promete gerar calafrios juntos dos partidos unionistas com que partilha o governo em Belfast.
RAQUEL MARTINS 25/06/2016 - 11:11
Ministros dos Negócios Estrangeiros dos países fundadores reúnem-se neste sábado em Berlim. França defende saída rápida, Alemanha cautelosa.
Ana Suspiro e Margarida Peixoto 24-06-2016 BREXIT
E agora?
Quais são os custos e implicações do Brexit para Portugal?
É uma pergunta para a qual ainda poucos arriscam uma resposta.
A incerteza é enorme.
A Europa ainda atravessa um primeiro momento de choque, de grande turbulência, tanto a nível político, como nos mercados financeiros.
Ainda assim, vale a pena alinhar as principais áreas onde se podem esperar impactos em Portugal: emigração, exportações, turismo, investimento e relações com a Europa.
Emigrantes. Reino Unido é o principal destino
Um dos maiores impactos esperados será sentido na emigração.
Nos anos de “chumbo” da aplicação do programa de resgate da troika, o Reino Unido passou ser o principal destino dos portugueses que deixaram o país à procura de emprego ou de uma valorização profissional que não encontram em Portugal.
Ninguém sabe, com certeza, como vão ficar estas pessoas.
Contudo, a diminuição do potencial de criação de empregos no país será uma das consequências de uma queda de produto interno bruto (PIB) e da atividade económica, como nota Muradali Ibrahimo, professor do ISEG, numa análise aos efeitos do resultado do referendo.
Outro professor do ISEG, António Afonso, antecipa “uma menor facilidade de circulação de mão-de-obra entre Portugal e o Reino Unido”.
Uma das marcas desse novo fluxo migratório é o elevado nível de qualificações profissionais dos que procuram o mercado britânico, destaca o mais recente relatório do Observatório das Emigrações, de 2015, mas cujos dados são de 2014: “O Reino Unido é hoje o primeiro país de destino da emigração portuguesa.
Trata-se de um fluxo com características novas, nomeadamente por incluir uma elevada percentagem de ativos com qualificações superiores”.
E esta é uma das áreas onde se teme um maior impacto, conforme ficou, aliás, visível nas reações dos responsáveis políticos portugueses.
Fica aqui um testemunho do desapontamento e a frustração dos portugueses que trabalham no Reino Unido.
O documento do Observatório aponta, ainda, alguns traços do perfil do emigrante português: É homem (55%), tem entre 25 e 34 anos (35%), está em Londres (46%), tem um curso superior — o Reino Unido é o destino em que é maior proporção de portugueses qualificados — e há alguma probabilidade de ser enfermeiro.
O afluxo de profissionais desta área é de tal forma intenso que justificou uma análise do fenómeno.
Todos os anos são formados em Portugal entre 3.000 a 3.500 enfermeiros e cerca um de terço — o correspondente a 1.200 — começou a trabalhar no Reino Unido em 2013.
Um inquérito conduzido por um enfermeiro, Nuno Pinto, via Facebook, a que responderam cerca de 350 profissionais a residir no país, mostrou que mais de metade não tencionava regressar a Portugal antes da reforma.
Segundo dados de 2014 da organização equivalente à Ordem dos Enfermeiros, a Nursing and Midwifery Council, estavam inscritos 3.155 profissionais portugueses.
Em 2014, o Reino Unido atraiu cerca de 31 mil portugueses.
Em 2013 foram 30 mil.
O número de novos emigrados no país da libra ultrapassou, já, destinos mais tradicionais como a França, a Suíça ou a Alemanha.
O número de residentes portugueses no país era de 136 mil, um pouco mais do que na Alemanha, mas ainda bastante menos do que em França, cerca de meio milhão, e Suíça — 253 mil, segundo dados ainda 2014.
O número de nacionais registados nos consulados ingleses era contudo mais significativo, quase 300.000 em 2014, o terceiro maior na Europa a seguir a França e Suíça e o quarto a nível mundial depois destes dois países e do Brasil.
A distância para alguns destinos clássicos de emigração ainda é mais expressiva quando se analisam as remessas enviadas para Portugal.
Do Reino Unido foram transferidos cerca de 202 milhões de euros num total de três mil milhões de euros em 2014.
Estes valores colocam os emigrantes no Reino Unido no quarto lugar do ranking das remessas dos emigrantes, atrás de França, Suíça e Angola.
E os ingleses em Portugal?
O número de residentes ingleses era de 17.230, num universo de 388.731 estrangeiros que residiam no ano passado em Portugal, segundo dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Ainda assim, os ingleses são a terceira comunidade europeia mais numerosa a seguir aos romenos e aos ucranianos.
Turismo nervoso. Mais de 20% dos turistas são britânicos
Os ingleses ainda são os principais visitantes estrangeiros em Portugal e este é um dos setores onde mais se teme os efeitos do Brexit.
Em 2014 e 2015, mais de 20% dos turistas que dormiram em Portugal tinha nacionalidade britânica, uma percentagem que sobe para 30% na região do Algarve.
Só no ano passado, houve mais de oito milhões de dormidas de residentes britânicos. Este número está muito acima dos turistas alemães que dormiram em Portugal no ano passado, 4,8 milhões, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), e mais do dobro dos franceses e dos espanhóis que visitaram Portugal em 2015.
Apesar de serem os que mais visitam território lusitano, os ingleses estão entre os que têm gastos médios diários mais baixos.
Segundo um levantamento realizado pelo INE, o turista médio britânico gastou 91,5 euros por dia, em média, soma que ficou abaixo do valor médio que se verificou entre os não residentes e que foi na ordem dos 104 euros por dia.
Ainda assim, no imediato, a saída do Reino Unido “não terá consequências relevantes”, defende João Loureiro, professor da Faculdade de Economia do Porto.
“Quem viajava para Portugal continuará a vir, não é porque o Reino Unido está num processo de saída que deixam de vir”, antecipa.
“A menos que haja uma recessão grave no Reino Unido e a libra se desvalorize muito”, ressalva.
Se este cenário se concretizar, o turismo sofrerá com a quebra do poder de compra dos ingleses, já que o euro também perdeu valor, embora menos,
Exportações. Uma área sob pressão
As empresas exportadoras poderão estar entre os agentes económicos mais afetados pelo Brexit.
Não só o Reino Unido é um dos principais mercados internacionais — logo, uma queda da economia e do poder de compra, acentuada pela desvalorização da libra face ao euro, castiga as empresas portuguesas — mas também porque se antecipa o regresso de taxas alfandegárias aos produtos destinados ao mercado britânico que tenham origem na União Europeia.
Esta ameaça é realçada por António Afonso, professor do ISEG.
“Para Portugal, o efeito poderá ser sentido ao nível das trocas comerciais, as quais poderão sofrer alguma redução com uma imposição de tarifas à importação por parte do Reino Unido”.
A saída da UE implica, também, o abandono da união aduaneira.
No entanto, há a expectativa de que venha a ser negociado um acordo de comércio livre com a União Europeia que permita suavizar o impacto económico do Brexit para as duas partes.
E, mais importante do que as taxas alfandegárias, é a compatibilidade ao nível das especificações técnicas e exigências ambientais dos bens transacionados.
O mercado britânico absorveu, em 2015, 6,7% das exportações portuguesas de bens, uma quota que tem vindo a crescer de forma sustentada desde, pelo menos, 2011.
No passado, as vendas para o Reino Unido representaram 3.350 milhões de euros e o saldo era claramente positivo para Portugal.
Máquinas e aparelhos, veículos automóveis e materiais de transporte, vestuário e calçado e bens alimentares estão entre as principais exportações portuguesas para o país da libra.
O Reino Unido é o quarto mercado mais importante para as empresas portuguesas e, em 2015 as exportações de bens e serviços para este país ultrapassaram sete mil milhões de euros.
Os britânicos são, ainda, investidores em Portugal.
No ano passado, até foram o segundo país de origem que mais investiu em Portugal, com cerca de 582 milhões de euros, embora os dados do Aicep, a partir das estatísticas do Banco de Portugal, contabilizem a entrada de recursos pelos países onde as empresas têm a sua sede, o que inflaciona dados de geografias fiscalmente favoráveis, como o Luxemburgo, que surge como o maior investidor em Portugal em 2015.
Dados do UK Trade and Investment, que corresponde ao Aicep britânico, revelam, ainda, que há 100 empresas britânicas a investir em Portugal.
Os principais investimentos do Reino Unido centram-se nos setores do têxtil e do vinho, a norte do país, e no imobiliário e turismo, a sul.
A presença das empresas inglesas tem ainda importância no setor da energia, com a petrolífera BP, a única multinacional do setor que ainda está em Portugal, e a International Power, acionista das sociedades que exploram centrais elétricas, Tubogás e Tejo Energia.
Impacto negativo será mais indireto, relações bilaterais fortes
“Fui deitar-me com o Reino Unido dentro da União Europeia e acordei com o Reino Unido fora “, testemunha António Comprido, o presidente da Câmara de Comércio Luso-britânica. Apesar de ter sido “uma grande surpresa para todos,” António Comprido acredita que o impacto será mais indireto do que direto.
Portugal pode sofrer os efeitos de uma crise económica na Europa e no Reino Unido, mas as relações comerciais entre os dois países vão continuar a ser fortes.
“Ao nível da câmara de comércio, não esperamos um grande impacto no comércio bilateral”, diz ao Observador.
O principal efeito, acrescenta, será a incerteza sobre o tempo e os aspetos concretos do processo de saída e isso pode ser um travão ao desenvolvimento de projetos novos e investimentos já decididos.
“É um fenómeno novo”.
A dimensão do impacto vai depender muito da forma e do tempo que demorar a concretizar a saída e das modalidades que serão adotadas pela União Europeia para se relacionar com o Reino Unido.
Será seguida uma solução comparável à que existe em relação à Noruega e à Suíça, “que têm um pé dentro e outro fora?”
António Saraiva, presidente da CIP, Confederação Empresarial de Portugal, contou ao Observador que está a contactar todos os seus associados para perceber quais são os setores de atividade que poderão estar mais expostos ao Reino Unido.
Por enquanto, não se arrisca a identificar nenhum.
Da mesma forma que ninguém se atreve a fazer contas enquanto não se conhecerem as condições efetivas de saída e o modelo que irá definir as futuras relações entre o bloco europeu e o Reino Unido.
É pela relevância das relações comerciais que Paulo Sande, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, lembra que, independentemente de se reafirmar europeísta de forma “assertiva”, o Governo português “tem de cuidar a sua relação com o Reino Unido”.
Europa tem de mudar, mas não pode começar de novo
A saída do Reino Unido terá, necessariamente, de ter impacto na política europeia e, por consequência, nas relações entre Portugal e a Europa.
“Se não houver mudanças, as coisas não ficam na mesma, ficam piores”, garante Paulo Sande.
“Não é possível abdicar das principais linhas políticas europeias”, garante.
Ou seja, Portugal não pode agora esperar que, de repente, a Europa passe a ser muito mais tolerante, ou que mude os limites previstos para o défice e a dívida, que tanto têm animado o debate sobre as sanções.
“As regras fundamentais da União Económica e Monetária, da convergência, da solidariedade, as exigências orçamentais não podem mudar de um dia para o outro”, alerta o ex-diretor do gabinete do Parlamento Europeu em Portugal.
Mas a Europa pode aproveitar o choque para tomar decisões.
“Os 27 países, e principalmente os 19 do euro, têm a oportunidade de se defenderem tomando medidas de reforço da união”, adianta João Cerejeira, professor na Faculdade de Economia do Porto.
Uma hipótese seria, por exemplo, tomar decisões sobre a dívida grega, aliviando o fardo daquele Estado-membro e mostrando solidariedade.
Consoante este caminho seja, ou não, seguido, assim serão os impactos para Portugal e para a sua relação com a Europa.
É que “o risco de desmantelamento é um grande risco”, sublinha o economista.
“O Governo português tem de ser assertivo na União Europeia”, corrobora Paulo Sande. Mas também tem de “cuidar a sua relação com o Reino Unido”, soma.
Para Miguel Monjardino, professor de geopolítica do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, a relação de Portugal com a Europa fica num dilema profundo: desde logo, a Alemanha perde um dos seus aliados pró austeridade.
Mas há mais.
“A lógica da União Europeia e da sua atual geografia ditaria que as regras teriam de ser reinterpretadas para favorecer agora a periferia.
Mas, para as economias credoras, o incentivo económico é o contrário”, explica.
Ou seja, os interesses políticos e económicos não estão alinhados.
Ativos financeiros. Em busca do porto seguro
“A nível de mercados financeiros, aquilo a que estamos a assistir é a uma fuga dos ativos com risco — ações, dívida de países periféricos, empresas com ativos no Reino Unido, empresas muito endividadas — para outros ativos mais seguros — a dívida alemã, o ouro, o dólar, o iene”, antecipa João Pereira Leite, diretor de investimentos do Banco Carregosa, ao Observador.
Este movimento interfere diretamente com Portugal, que está no grupo dos periféricos e endividados.
Os juros da dívida pública portuguesa refletiram a decisão, tendo-se agravado mais de 32 pontos base na sequência da notícia, ao mesmo tempo que os da Alemanha caíram quase 17.
Pior: “esta é uma notícia com impacto diferente do que se verifica quando há ataques terroristas, é mais duradoura”, garante.
Daí que o especialista coloque agora completamente de parte a hipótese de o Governo cumprir a meta de crescimento do PIB (produto interno bruto), inscrita no Orçamento do Estado para 2016, de 1,8%.
“É, neste momento, uma miragem”, assegura.
“Lamentamos profundamente a decisão do Reino Unido de saída da União Europeia, veredicto que não poderia deixar de provocar forte volatilidade nos mercados financeiros, entre outros possíveis impactos”, reagiu a Associação Portuguesa de Bancos (APB).
“Os próximos tempos serão de inevitável ajustamento, tendo em conta que se trata de um contexto sem precedentes”, assume o lobby da banca portuguesa, apesar de garantir que os bancos se prepararam, “naturalmente”, para esta contingência.
“O setor continuará a assegurar a prestação aos seus clientes, particulares e empresas, de todos os serviços com normalidade”, assegura a APB.
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